Lula consegue o que queria para presidir Câmara e Senado (e saiba por que ainda assim ele está tenso)

História por Jaqueline Mendes e Paula Cristina • IstoÉ

Tudo ficou igual. Mas pior. O que pode parecer incoerência traduz a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado, na quarta-feira (1). Tudo ficou igual porque os rostos vencedores são os mesmos. O senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) derrotou Rogério Marino (PL-RN), pelo placar de 49 votos a 32. Na outra Casa, Arthur Lira (PP-AL) fez 464 votos (num total de 513) e atropelou Chico Alencar (PSOL-RJ), com 21 apoios, e Marcelo Van Hattem (Novo-RJ), com 19. Mas nada será como antes porque, apesar do repeteco no comando das duas Casas Legislativas ­— como tanto queria o presidente Lula e sua bancada —, as composições, o equilíbrio de forças e os desafios são muito diferentes dos últimos anos. Este Congresso é muito menos alinhado ao presidente. E a pergunta decisiva é: ter Pacheco e Lira à frente das poderosas presidências bastará para a governabilidade de Lula?

REUTERS/Ueslei Marcelino© REUTERS/Ueslei Marcelino

A resposta mais provável é não. O que deixa a relação tensa desde o primeiro minuto. No dia da votação, deputados já carregavam cartazetes com “Fora, Lula”. O tom adotado entre os bolsonaristas é travar toda e qualquer pauta do governo, no melhor estilo do quanto pior, melhor. O Centrão, mais uma vez opera em compasso de espera, analisando o terreno antes de decidir o próximo passo. Para os petistas e outros aliados do governo, sobrou uma dura realidade: a de que há pouca munição para as batalhas. Traduzindo, o governo precisará decidir qual a agenda de pautas porque sabe que não vencerá a maior parte delas. Isso vai fazer a bomba cair na mão da equipe econômica. E o senso comum diz que o melhor plano é enviar a Reforma Tributária. O tema forçaria parte dos parlamentares autointitulados liberais apoiar a medida.

Uma potencial primeira vitória no Congresso é tida como essencial para a governabilidade, justamente porque não haverá medidas como Orçamento Secreto e, diferentemente dos governos Lula I e II (e Dilma Rousseff é prova viva disso), o Brasil vive hoje em um parlamentarismo no armário. O economista Bruno Carazza, doutor em direito econômico pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), diz que a missão do novo governo será complexa, mesmo com a permanência de Pacheco e Lira. “Lula terá de exercitar toda a habilidade política porque a oposição bolsonarista, especialmente no Senado, cresceu muito na última eleição.” Para reverter isso, a solução será, “se solidificar em direção ao centro.”

As eleições de 2022 despejaram Bolsonaro do Palácio do Planalto, mas fortaleceram a direita e a extrema direita no Legislativo. Na Câmara dos Deputados, a maior bancada ficou com o PL, partido do ex-presidente e liderado por Valdemar da Costa Neto, que elegeu 99 deputados. A maior eleição de um partido na história. Os votos da Federação Brasil da Esperança (que soma PT, PC do B e PV) tem 81 cadeiras. A terceira maior bancada será a do União Brasil, com 59 deputados. No Senado, o PL tem 14 nomes, novamente a maior bancada. O segundo maior partido do Senado é o PSD, que terá 11 nomes. União Brasil e MDB terão dez senadores cada, e o PT, nove.

Lula consegue o que queria para presidir Câmara e Senado (e saiba por que ainda assim ele está tenso)© Fornecido por IstoÉ Dinheiro

ORÇAMENTO SECRETO Com essa pluralidade ideológica, os dois novos presidentes do Legislativo precisaram fazer discursos diplomáticos. Pacheco ressaltou o papel de defesa da democracia e defendeu o aprimoramento do diálogo. “O discurso de ódio, da mentira, o discurso golpista que aflige e afasta a democracia deve ser desestimulado, desmentido, combatido por todos nós.” Na mesma linha, Lira abandonou o tom de aliado bolsonarista. “É hora de ver cada um no seu quadrado constitucional, para voltarmos a ver poderes articulando, interagindo, com a clareza exata de onde termina o espaço de um e onde começa o espaço do outro”, afirmou. Os dois discursos, vale lembrar, acontecem em um momento em que ambos os líderes não possuem mais o mesmo poder de barganha com seus pares, visto que o STF considerou inconstitucional o Orçamento Secreto.

Há dois desafios principais. Primeiro porque o bolsonarismo está mais forte e bem representado — em quantidade, o que deve dificultar aprovação de Propostas de Emendas Constitucionais (PECs) e reformas. Segundo porque o alinhamento do Judiciário com o Executivo exigirá do presidente Lula uma imensa capacidade de articulação para restabelecer a harmonia entre os Poderes e promover a estabilidade econômica com o equilíbrio entre a responsabilidade fiscal e a social. Em resumo, reeleger Pacheco e Lira foi o menor dos desafios.

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By valeon