Senhora de 102 anos dá aulas de ginástica em casa para idosos
Foto: Elk Ridge Village Senior/via W.P.
Por Kellie Gormly – Jornal Estadão – The Whasington Post
‘Elas brincam comigo dizendo que eu sou má, porque quando fazemos os exercícios eu quero que elas façam direito e usem os músculos’, afirmou a professora Jean Bailey
Cerca de uma dúzia de mulheres se reúne na aula de ginástica enquanto sua professora as guia através dos movimentos. “Nado costas!”, orienta Jean Bailey de sua cadeira, levantando os braços para o alto, conforme as residentes do retiro de idosos Elk Ridge Village Senior Living, em Omaha, iniciam rapidamente a rotação de braços. Todas se esforçam ao máximo, como a professora espera.
Bailey, que tem 102 anos e mora nas instalações de vida independente do retiro, tem dado essa aula quatro vezes por semana no saguão do segundo andar da instituição há cerca de três anos. E nem pensa em diminuir o ritmo.
“Quando ficar velha, eu paro”, afirmou Bailey, que vive em Elk Ridge há aproximadamente 14 anos. Algumas de suas alunas têm artrites que limitam seus movimentos, mas conseguem fazer confortavelmente exercícios de alongamento e se beneficiam deles, afirmou Bailey, que com frequência usa um andador para se locomover. Ela afirma que, mesmo assim, é uma treinadora exigente.
“Elas brincam comigo dizendo que eu sou má, porque quando fazemos os exercícios eu quero que elas façam direito e usem os músculos”, afirmou ela. Mas não malvada demais. As alunas não continuariam a aparecer se não estivessem gostando.
“Parece que as meninas percebem o que vou fazer por elas”, disse Bailey. “Mas também faço isso por mim.” Um homem costumava assistir à aula, mas morreu. Agora só tem mulher.
Bailey começou a dar aulas de ginástica em 2020, quando a pandemia de coronavírus começou e as pessoas eram isoladas em seus quartos.
Ela tinha 99 anos na época, considerada velha até entre os residentes de Elk Ridge. Mas não se intimidou com as jovens em torno dela.
Bailey afirmou que queria permanecer ativa e que sempre foi boa em motivar as pessoas, portanto ela convidou as vizinhas para trazer cadeiras até o saguão para fazer alguns exercícios simples, em distanciamento social.
“Eu acho realmente que, se não mantemos nossas mentes e corpos ocupados, não há sentido em estarmos aqui”, afirmou Bailey. As vizinhas gostaram tanto que não pararam de aparecer.
Rotina de aulas
As sessões começam às 9h45, o que dá às participantes tempo de se vestir e tomar café da manhã. Bailey dá as aulas de 30 minutos às segundas, quartas e quintas-feiras e aos sábados, e inicia as práticas com uma oração. O grupo faz cerca de 20 tipos de alongamento para as partes superior e inferior do corpo, incluindo rotações de pescoço, extensões e flexões de tornozelo e flexões de tronco para alcançar o chão.
“A gente mexe todas as partes do corpo, absolutamente, das mãos aos dedos dos pés”, afirmou Bailey. As aulas de ginástica aprofundaram as amizades entre as mulheres.
“A gente se aproximou muito lá no nosso andar”, disse Bailey. “Uma de nós sempre ajuda quando alguém precisa. Nós realmente ficamos atentas uma à outra.”
Phyllis Black, de 87 anos, vive mais adiante no mesmo corredor que Bailey e adora as aulas de ginástica; Black disse que se perde alguma sessão, se sente enrijecida.
Quando Black se mudou para Elk Ridge, cerca de três anos e meio atrás, Bailey a recebeu com cookies fresquinhos e dois tomates colhidos no jardim de um residente.
Bailey com frequência oferece bolinhos depois das aulas quando alguém faz aniversário. Nessa idade, afirmou ela, todos os aniversários são importantes.
“Ela é uma vizinha muito boa e também é uma boa amiga”, disse Black a respeito de Bailey. “Ela é muito talentosa.”
Nascida na Grande Depressão
A longevidade e a resiliência Bailey vêm de uma vida de alguma dificuldade. Nascida em 1921, no Wyoming, ela cresceu durante a Grande Depressão. Uma entre quatro filhos, sua mãe a entregou para outra família quando ela tinha 3 anos, e ela cresceu como filha única de um pai que trabalhava na linha ferroviária. Sua família se mudou para Iowa e depois para Nebraska, onde Bailey viveu desde então.
Quando era adolescente, Bailey trabalhou como modelo para a JC Penney. Ela se casou em 1942, mas seu marido, Loren Bailey, morreu em 1989. Eles tiveram três filhos: Bruce, Pennyrae e Patty, que morreu de câncer aos 55 anos. Bailey tem cinco netos e quatro bisnetos.
Quando seus filhos eram pequenos, Bailey era dona de casa, mas depois se tornou florista — uma prática da qual ela ainda desfruta como hobby. Bailey compra flores artificiais e faz buquês para decorar a sede da instituição e dar de presente para alguns moradores. Ela também ajuda a dar cartas em jogos de vinte e um.
Laura Stuart, até recentemente diretora de estilo de vida de Elk Ridge, chama Bailey de “abelha-rainha”. “Ela traz sua experiência com arranjos florais e está sempre fazendo arranjos lindos”, afirmou Stuart. “Ela nos traz isso, e é uma bênção que ela ainda esteja aqui conosco e seja capaz até de fazer arranjos florais intrincados.” Stuart afirmou que Bailey faz tudo com o coração.
Em Elk Ridge – que hospeda cerca de 145 residentes em instalações de vida independente e cerca de 205 em semi-internação e acompanhamento para males de perda de memória — os moradores podem participar de atividades físicas como clubes de caminhada, tai chi e musculação. Mas as meninas de Bailey parecem preferir a aula dela por causa de sua calidez e personalidade divertida, assim como pela suavidade dos alongamentos para pessoas com problemas de mobilidade, afirma Sean Tran, diretor de operações de Elk Ridge.
“Mais do que qualquer coisa, a atitude geral dela em relação à vida (…) é simplesmente notável”, disse ele a respeito de Bailey. “Ela é provavelmente a pessoa mais gentil, acolhedora e atenciosa que eu já conheci. Nada impede seu caminho. Ela segue adiante, não importa o que acontecer.”
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Bailey, afirmou Tran, inspira as pessoas porque todos olham para ela e pensam: “se ela consegue fazer isso aos 102 anos, na minha idade eu também consigo seja o que for”.
Bailey – que trabalhou como voluntária em um hospital por mais de 30 anos no departamento de diagnóstico por imagem — não sabe ao certo qual é a fórmula para sua longevidade. Ela disse que comer alimentos saudáveis e permanecer ativa provavelmente desempenharam um papel significativo.
“Eu realmente não sei”, afirmou Bailey, que até hoje lava e passa suas próprias roupas. “Talvez Deus ainda não esteja pronto para mim. Eu tenho que me manter ocupada. Eu não acho certo simplesmente ficar sentada assistindo TV”, afirmou Bailey. Mas a idade tem seus privilégios. “Estou ficando boa em tirar sonecas hoje em dia”, disse ela dando risada. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL