Reforma tributária e produtividade

Bernard Appy* – Jornal Estadão

A principal razão pela qual o Brasil necessita de uma reforma da tributação de bens e serviços – como a proposta na PEC 45/2019, da Câmara dos Deputados – é seu enorme impacto sobre o potencial de crescimento do País. Segundo estudo do economista Bráulio Borges, disponível no site do Centro de Cidadania Fiscal, a aprovação da PEC 45 elevaria o Produto Interno Bruto (PIB) potencial do Brasil em cerca de 20 pontos porcentuais (p.p.) em 15 anos e em 24 p.p. no longo prazo.

Cerca de 1/3 desse impacto adviria do aumento da taxa de investimento e do estoque de capital, em decorrência, principalmente, da eliminação da cumulatividade do sistema atual. Cerca de 2/3 do aumento do potencial de crescimento resultariam da elevação da produtividade total dos fatores, que é um indicador da eficiência da economia.

Neste artigo, busco explicar por que a reforma tributária tem um impacto tão relevante sobre a produtividade. Alguns dos motivos são mais conhecidos e aparentes; outros são menos.

Em primeiro lugar, a reforma, nos termos propostos na PEC 45, teria como consequência uma enorme redução da burocracia necessária para o pagamento de tributos. Segundo estudo do Banco Mundial, o Brasil é o campeão mundial de burocracia tributária (medida em horas gastas por uma empresa de porte médio para pagar impostos) em decorrência, sobretudo, da complexidade dos tributos indiretos sobre bens e serviços. Tendo por base esse estudo, a Endeavor calculou que a reforma tributária poderia reduzir o número de horas despendidas para o pagamento de tributos indiretos em 68%. Tal simplificação afeta diretamente a produtividade, pois libera recursos improdutivos – hoje alocados em processos burocráticos – para serem utilizados em atividades produtivas.

Em segundo lugar, a simplificação do sistema tributário também é essencial para reduzir o grau de litígio sobre matérias tributárias no País. Estudo elaborado pelo Insper estima que o contencioso tributário brasileiro – consideradas as esferas administrativa e judicial e os três níveis de governo – chega a 73% do PIB. Esse nível absurdo de litígio – provavelmente também o maior do mundo – afeta a produtividade de duas formas: de um lado, por causa do elevado custo de defesa das empresas e do Fisco (com advogados, procuradores, etc.); de outro, pelo aumento da insegurança jurídica, que, além de consumir muita energia da alta administração das empresas, também resulta em menor investimento.

Por fim, e principalmente, os atuais tributos indiretos prejudicam a produtividade ao induzir uma organização extremamente ineficiente da estrutura produtiva brasileira. A perda de produtividade decorre da mudança de preços relativos provocada por um sistema tributário caracterizado por múltiplos tributos e uma quantidade enorme de alíquotas, benefícios fiscais e regimes especiais. Ao distorcer preços relativos, a tributação induz a alocação de recursos em formas de organização da produção que são menos eficientes, ou seja, que requerem um volume maior de capital e de trabalho para produzir a mesma quantidade de bens e serviços finais.

Tais distorções podem ser setoriais, como, por exemplo, no caso da construção civil – pois no Brasil a construção em alvenaria é menos tributada que a construção com estruturas pré-fabricadas. Podem ser regionais, como ocorre no caso dos centros de distribuição, que, por causa de benefícios fiscais, se estabelecem em locais onde o custo de logística é mais elevado. E podem prejudicar a terceirização de atividades, por razões meramente tributárias. Esses são apenas alguns exemplos de deturpações que são generalizadas. Em todos os casos, o resultado é o uso ineficiente dos recursos disponíveis.

Quando consideradas todas as distorções geradas pelo sistema tributário atual, é fácil de entender por que a reforma tributária pode ter um impacto tão relevante sobre a produtividade e o investimento e, portanto, sobre o potencial de crescimento do Brasil.

*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL

Loading

By valeon