Polaridade política no país dificulta a implementação ou adoção de mudanças mais profundas, analista cientista político
Por Clarissa Guimarães – Itatiaia
O clima de instabilidade política na Argentina, aliada à desvalorização do peso frente ao dólar, tem levado preocupação para os mineiros que moram no país. O governo da Argentina disse em comunicado recente que o Fundo Monetário Internacional (FMI) queria uma desvalorização de “100%” do peso do país, antes dois lados concordarem com uma correção de 18% feita na semana passada. Com a inflação alta e o dinheiro dolarizado (cotado em dólar), os mineiros que moram no país relatam insegurança.
“Tem sido um dos grandes problemas e a sociedade tem sentido isso na pele. Para poder compensar um pouco tudo isso os argentinos têm buscado, sim, dolarizar uma boa parte dos serviços que existem no país como aluguel, compra de imóveis e veículos”. O relato é da mineira de Barra Longa, na Zona da Mata, a advogada Lunara Machado de Almeida, 34 anos que afirma que a todo momentos eles são surpreendidos com a alta nos preços.
“Somos surpreendidos a todo tempo, todos os dias existe uma mudança nas contas, água, luz, supermercado. E por esse motivo, às vezes, isso nos deixa inseguros sem saber como será até o final do mês. Aumentou o nível de pobreza, de miséria, porém o governo oferece inúmeros subsídios. Então, a realidade argentina fica muito parecida com a brasileira, nesse sentido.”
Para o Mario Schettino, professor de Relações Internacionais do Ibmec em Belo Horizonte, para entender o atual cenário argentino é preciso voltar um pouco no tempo. Isso porque o país latino americano tem uma configuração política atual que vem desde a década de 1950, quando o país era estruturado entre dois polos: o peronista e o antiperonista.
“Quando a gente olha para história política eleitoral da Argentina a gente observa que desde a década de 50, a política se estrutura entre dois polos – o polo peronista e o polo antiperionista. O polo peronista defende uma presença maior do estado na economia, com maior fomento das atividades econômicas da industrialização centralizadas no governo federal. Já o antiperionismo vai criticar essa centralidade ou intervenção do estado na economia ou até mesmo uma concentração de poder no governo federal. Dentro do peronismo, os grupos de direita vão ser mais intervencionistas e autoritários; e os grupos de esquerda vão defender esse papel do estado na economia e no prover dos bens públicos.”
Polaridade
Para Mário essa polaridade é o que dificulta o país a implementar ou adotar mudanças mais profundas para solucionar o problema da crescente inflação no país e a grande desvalorização do peso frente ao dólar.
“A Argentina entrou numa crise em 1999, porque sua economia era dolarizada. E aí quando o Brasil faz uma grande desvalorização do real isso impactou a economia Argentina e o comércio exterior argentino uma vez que, produzir no Brasil e exportar para a Argentina era muito mais barato. Isso leva uma corrida aos bancos e a quebra do sistema financeiro da Argentina que só vai recuperar o PIB per capita em 2007. Então, depois de sete anos sem essa recuperação econômica é uma recuperação econômica ainda lenta. Paralelo a isso, o país teve a declaração de não pagamento de empréstimos e aí a credibilidade da Argentina cai bastante.”
Para o mineiro de Abre Campo, na Zona da Mata, Rafael Daher, 40 anos, que é administrador e professor em Buenos Aires, o maior desafio hoje no país é morar de aluguel, exatamente porque os preços são cotados em dólar.
“O aluguel é a despesa mais alta na Argentina, para quem quer que seja. Moradia de qualquer natureza, seja temporária ou não, é um absurdo. Tudo é cotado em dólar. Pagamos, em média, 264 dólares/mês para um apartamento de quarto e sala – 34 m² – não mobiliado. Água e luz são mais baratos.”
Retomada
Países como Estados Unidos, Brasil, União Europeia e China têm um papel importante para tentar estabilizar a economia Argentina pós eleições presidenciais no país, marcadas para outubro.
“Há uma necessidade muito grande de entrada de moeda estrangeira dentro da Argentina para estabilizar o peso e, assim, a inflação. O grande problema da inflação Argentina é exatamente essa desvalorização do peso e portanto produtos importados ficam mais caros, insumos ficam mais caros, e isso impacta o dia a dia de grande parte da parcela da população que não tem uma renda que sobra um pouquinho e que permite que ele sobreviva.”