Kakay: por que o impeachment de Bolsonaro é necessário (e por que ele não acontece)
Morris Kachani
“Hoje sou absolutamente favorável ao impeachment. Bolsonaro abusou da quantidade de crimes de responsabilidade. Porém, não há ambiente político para o impeachment passar. Com Dilma se passou o contrário; não havia crime de responsabilidade, mas ela perdeu apoio político”
Assista à entrevista: https://youtu.be/xwhVeCQTmBY
É sempre elucidativo, conversar com o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, apelido Kakay. Não apenas por se tratar de um dos maiores criminalistas do país, com uma carteira graúda de clientes. Gente de toda a espécie. Alguns por quem talvez você não poria a mão no fogo. Três presidentes da República (José Sarney, Collor e Itamar Franco), um vice (Marco Maciel), cinco presidentes de partido, noventa governadores, dezenas de parlamentares e mais de 20 ministros.
Clientes como Edison Lobão, Roseana Sarney, Aécio Neves, Ciro Nogueira, José Dirceu…. Também já defendeu grandes empreiteiras (Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS), bancos (Sofisa, BMG, BMC, Pine), banqueiros (Daniel Dantas, Salvatore Cacciola, Joseph Safra) e empresários.
O que levou Inconsciente Coletivo a procurar o Kakay na verdade foi uma pergunta… um pouco óbvia, até: Nenhum governante recebeu tantos pedidos de impeachment como Bolsonaro (53). E a pergunta é: moralmente, e também juridicamente, um presidente com tantos crimes de responsabilidade atribuídos, não deveria ser afastado?
“O impeachment é um processo politico e jurídico. No final, bem mais político – 90%, eu diria. Aqueles que entendem do Congresso, dizem que o impeachment só passa quando ele tiver menos de 20% de aprovação. Enquanto o Centrão estiver dando essa musculatura política de apoio com muito custo infelizmente, não passará”.
“Hoje há 53 pedidos. De forma madura, Rodrigo Maia não encaminhou. Por que? Porque Bolsonaro tem 40% de aprovação e o impeachment não passa. Então é até bom que Maia não apresente, porque se o impeachment não passa, fortalece o cidadão. É como se fosse uma absolvição do pretenso crime. E não é. É força política”.
“A política é como uma nuvem, já dizia Tancredo. Às vezes se instala ou seja, se tiver um movimento grande o Centrão muda. O presidente do Centrão tomou café da manhã com a Dilma no dia do impeachment e votou contra. Por enquanto as condições são plenas sob o aspecto jurídico, mas politicamente não”.
“Acho que o momento mais grave foi quando ele tentou dar um golpe. Através de fake news instigou a população a fechar o Congresso e o Supremo. Só não avançou porque as Forças Armadas não toparam entrar. Elas são sérias e seguem a Constituição. E além disso, há milícias imiscuídas neste governo.
Nós tivemos um momento de grave tensão institucional. Ali ficou caracterizada a necessidade de fazer impeachment”.
“Bolsonaro comente crime comum ao dizer para as pessoas irem à rua ou apertando as mãos de seus apoiadores, sabendo que existe uma pandemia. A presidência da república carrega um valor simbólico. Ele nega. Teríamos que ter o convencimento do Procurador Geral da República por só ele pode apresentar um pedido desta natureza. E depois ainda precisaria passar por 2/3 do Congresso”.
“Eu me preocupo bastante com o excesso de poder do judiciário. Não existe vácuo de poder. Com o enfraquecimento dos poderes legislativo e executivo, emerge o judiciário, com o apoio da grande mídia.
É um excesso de poder. Por exemplo, rapidamente o ministro Gilmar impediu a posse de Lula na Casa Civil, dizendo se tratar de desvio de finalidade. Aquilo mudou a história Do Brasil; se Lula vira chefe da casa civil, provavelmente não teria impeachment, porque ele é encantador de serpentes, provavelmente iria compor acordo com o Congresso.
Este ano o ministro Alexandre impediu a posse do Ramagem na PF. Fui contra da mesma forma. Do meu ponto de vista se trata de interferência sobre um poder que é autônomo. O STF pode muito mas não pode tudo. Nenhum poder pode tudo. Este é o equilíbrio da democracia”.
“O Brasil é um país muito interessante. Se critica muito a relação de proximidade até física entre congressista e ministros do STF. Nós não vivemos numa bolha, não temos o estilo americano em que o juiz só fala dos autos e não participa da vida nacional. Isso não dá pra voltar”.
“Uma chapa com Luciano Huck e Sergio Moro talvez fosse a única hipótese em que a gente pudesse piorar a situação no Brasil. Moro não é só extrema direita, ele esta na raiz de Bolsonaro. É um projeto de poder que ele tinha. Prendeu principal opositor de Bolsonaro e mercadejou a toga. Esbofeteou o poder judiciário. Virou ministro e depois saiu, mas saiu porque era briga de quadrilha. Esse bolsonarismo em parte foi gestado na Força Tarefa da Lava Jato, com essa visão fascista, punitivista, em que a Constituição não vale nada”.
“Nunca ouvi falar sobre política que tivesse algum tipo de encantamento. Luciano Huck é um empresário bem-sucedido. Não quero ter preconceito, mas acho que o Brasil tem que superar essa estratégia bolsonarista de acabar com a política. Uma das bases desse fascismo foi acabar com a política, por isso que surge um Bolsonaro, um Moro, e por isso é que surge um Luciano Huck”.
“Haddad é uma pessoa que tem a capacidade. Foi ministro da educação e prefeito de São Paulo. Infelizmente, levou muito tempo para se soltar de algumas amarras que precisava se soltar. Independentemente do PT”.
“A grande mensagem subliminar destas eleições é o respeito ao político. Nos não podemos criminalizá-lo. A democracia precisa do político. As pessoas têm medo de dizer isso hoje em dia. Eu
prefiro este Congresso estranho, mas que tem legitimidade, pelo menos foi eleito”.
“Kássio Nunes foi uma excelente nomeação no STF. As pessoas se surpreendem. Às vezes, o Bolsonaro vai fazendo um judiciário melhor do que a Dilma e o Lula fizeram”.