História de Notas & Informações – Jornal Estadão

O alívio da inflação em janeiro, com alta de apenas 0,16%, depois de um aumento de 0,52% em dezembro, poderia ser auspicioso para a economia, não fosse o bônus de Itaipu, que deixou a energia elétrica 14,21% mais barata no mês. A redução com o custo da eletricidade gerada pela usina impactou o IPCA em -0,55 ponto porcentual. Sem essa contribuição, a inflação de janeiro teria chegado a 0,71%, e a taxa acumulada em 12 meses teria alcançado 5,13%, segundo cálculo do economista André Braz, do FGV Ibre.

A questão é que o “desconto” nas tarifas de energia tem fôlego curto, e a queda verificada no mês passado virá como alta em fevereiro. É um movimento natural, haja vista que não houve mudança estrutural na formação de preços, mas apenas um encontro de contas no saldo da usina administrada paritariamente por Brasil e Paraguai. E, mesmo com a forte desaceleração que o bônus de R$ 1,3 bilhão repassado às contas de luz representou para a inflação em janeiro, a taxa anualizada continuou acima do teto da meta de 3% fixada pelo governo, chegando a 4,56% em janeiro.

Importantes grupos de preços continuam subindo, como transportes e alimentos, estes em sua quinta alta mensal consecutiva, e o peso da inflação sobre o consumidor não ficou atenuado pelo resultado fora da curva do mês de janeiro. Apesar do respiro do IPCA, a escalada dos preços continua preocupante – ou, para usar a linguagem do Banco Central, o cenário é adverso para a inflação dos alimentos no médio prazo.

Mas o governo Lula da Silva decidiu entrar no modo negação e desdenhar olimpicamente da pressão inflacionária e seus efeitos na economia. Primeiro, o presidente recomendou à população que deixasse de comprar produtos caros para forçar a queda de preços. O roteiro resultou numa enxurrada de críticas, pois a carestia à qual se refere o petista abrange itens essenciais, como café, óleo, leite e carne, e não supérfluos ou produtos sofisticados.

Na sequência, ministros também minimizaram a inflação dos alimentos, justamente um dos itens que mais pesam no bolso dos mais pobres. De acordo com o IBGE, famílias com renda mensal de até dois salários mínimos gastam mais de 60% de seu orçamento mensal para custear casa e comida.

Antes mesmo da divulgação da desaceleração do IPCA de janeiro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em entrevista a uma rádio de Caruaru (PE), disse que “todos os preços” hoje estão abaixo dos que “o presidente Lula herdou de Bolsonaro”, e sustentou que a política de valorização do salário mínimo, com reajustes acima da inflação, vai manter o poder de compra. Há pouco tempo, era Haddad quem insistia em mais medidas de ajuste fiscal para compensar o minguado pacote fiscal anunciado em novembro na busca pelo reequilíbrio das contas públicas.

Agora, o ministro atribui quase exclusivamente ao aumento do dólar – e seu impacto nas exportações – a alta dos preços internos, e coloca a pressão cambial tão somente na conta da eleição de Donald Trump como presidente dos EUA. Este, aliás, foi um dos argumentos que sustentaram a ideia de uma ala do PT segundo a qual a taxação das exportações poderia reduzir a inflação, uma possibilidade que causou reação negativa tão forte que obrigou o governo a descartá-la oficialmente.

Taxar produtos exportados ou fixar novas regras para os cartões de refeição não resolverá o problema da inflação, mas o governo segue tentando subestimar a alta inflacionária. Em entrevista a uma rádio na Bahia, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, que chegou a falar em um “conjunto de intervenções” para baratear preços nos supermercados, disse que a inflação foi “infinitamente menor” nos dois anos do governo Lula do que nos quatro de Bolsonaro.

Houve, de fato, expressivos estouros de meta na gestão Bolsonaro, especialmente nos dois últimos anos, quando a inflação bateu 10,06% (2021) e 5,79% (2022), parte pelas ações de combate à pandemia de covid-19, parte por gastos em ano de campanha eleitoral. Em vez de buscar se eximir de sua responsabilidade com base em comparações, o governo deveria olhar para si mesmo e concentrar esforços na redução de seus próprios gastos.

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By valeon