História de Juan Carlos Arruda – Jornal Estadão
Inspirado no romance A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera, vemos no Brasil um fenômeno semelhante: a “insustentável leveza do ter”. Kundera explora a fragilidade da existência humana frente a escolhas efêmeras e consequências passageiras. De forma análoga, o modelo econômico brasileiro aposta em políticas distributivas para estimular o consumo imediato, mas que se mostram insustentáveis a médio e longo prazo.
Nas últimas décadas, programas públicos, especialmente nas gestões de Lula, investiram em iniciativas que promovem o consumo nas classes mais baixas. Esses programas geram resultados rápidos e visíveis: famílias antes marginalizadas passam a ter acesso a bens essenciais e até itens de luxo, aquecendo o mercado e promovendo inclusão social. Contudo, sem uma base econômica robusta, essa expansão se torna insustentável, carecendo de fundamentos para garantir sua continuidade.
Esse crescimento focado no “ter” imediato – consumo facilitado por subsídios e políticas redistributivas – revela-se, muitas vezes, efêmero e insuficiente. Como uma chama intensa que logo se apaga, o estímulo ao consumo pode aliviar tensões econômicas por um breve período, mas pouco contribui para o fortalecimento das estruturas produtivas do País. Sem avanços significativos em áreas como educação, inovação e infraestrutura, a economia brasileira permanece vulnerável e presa a ciclos passageiros de crescimento que rapidamente perdem força.
Hoje, Lula prepara novas iniciativas para aliviar a pressão financeira das camadas mais pobres, apostando novamente em programas de transferência de renda. Em um país de desigualdade profunda, essas medidas são importantes, mas a falta de uma estratégia sustentável para o crescimento econômico é preocupante. Sem condições estruturais sólidas, a economia brasileira segue refém de ciclos temporários.
Programas públicos, especialmente nas gestões de Lula, investiram em iniciativas que promovem o consumo nas classes mais baixas Foto: Wilton Junior/Estadão
Ao focarmos apenas no “ter” imediato, ignoramos o “ser” estrutural e resiliente que uma economia necessita para suportar crises e promover o desenvolvimento. Em vez de construir essa base, o Brasil continua preso a ciclos de consumo que cessam tão logo os estímulos acabam, sem uma infraestrutura que sustente o crescimento duradouro.
A “insustentável leveza do ter” caracteriza-se, então, como um ciclo recorrente que não cria raízes profundas. Programas redistributivos são essenciais, mas, sem uma visão de longo prazo, continuaremos vivendo momentos efêmeros de alívio econômico, sem consolidar o desenvolvimento real que o Brasil merece.