Em uma sociedade onde as escolhas são livres, o debate leva ao desenvolvimento
Laura Karpuska*, O Estado de S.Paulo
Instituições são fundamentais para o crescimento econômico. Direitos de propriedade bem definidos e mercados funcionais são os alicerces do desenvolvimento. Por muito tempo, a teoria econômica considerou o acúmulo de capital físico e intelectual como principais determinantes do nível de crescimento de um país. Embora certamente importantes, hoje é difícil acreditar que o capital seja o fator fundamental do crescimento.
O que leva alguns países a terem indivíduos mais educados e maquinários mais sofisticados, ou seja, a terem uma melhor tecnologia e inovarem mais? Parece um pouco simplista afirmar que aumento de tecnologia causa crescimento. O que, na verdade, estimula os avanços tecnológicos? Condições demográficas, Estado de Direito (“Rule of Law”), regulação de externalidades e combate às desigualdades de acesso certamente fazem parte do conjunto de instituições determinantes para a tecnologia. Mas é possível ir além.
Segundo a economista Deirdre McCloskey, o fundamento para que atividades intelectuais, artísticas e científicas promovam conhecimento e inovação é um ambiente sem censura. Liberdade é a força motriz da inovação e, portanto, do crescimento.
Deirdre não está sozinha. A economista Petra Moser tem uma longa lista de estudos que mostram a importância de um ambiente de propriedade intelectual saudável, para que exista crescimento econômico e bem-estar social. Sem inovação, não há crescimento robusto. A inovação acontece em ambientes em que direitos de propriedades são bem definidos e trocas intelectuais são possíveis. Sem trocas, não há aprendizado. Sem aprendizado, não há avanço. E essas trocas acontecem de forma mais efetiva quando existe liberdade criativa e de comunicação. Liberdade de expressão é fundamental para inovação.
Mas liberdades, de forma ampla, não são fundamentais apenas para o crescimento e desenvolvimento econômico. A liberdade é também fundamental para o bom funcionamento das instituições políticas. A democracia, que mais recentemente entrou na lista de causas do crescimento econômico no longo prazo, como mostrado por Acemoglu, Naudi, Restrepo e Robinson, está intrinsecamente ligada à liberdade.
A democracia acontece, na prática, de forma caótica. São muitos os elementos que sustentam a soberania do povo. A própria crença coletiva no sistema democrático é, em si, uma necessidade para sua efetividade e manutenção.
Participação social, direitos civis e liberdade de expressão são exemplos de mecanismos fundamentais da democracia. Assim como a liberdade intelectual precede o avanço tecnológico, acredito que a liberdade de expressão preceda os direitos civis e a própria participação popular no monitoramento do governo. Se nós não podemos adjetivar o representante da soberania, que instrumento nos sobram para persuadir o governo e uns aos outros? Como saímos às ruas pacificamente se não pudermos qualificar criticamente o governo ou o governante? Que direito civil temos se não pudermos demandar nossos direitos? A retórica é fundamental no debate democrático, e ela só acontece de forma efetiva se há liberdade de expressão.
Em uma sociedade em que as escolhas são livres, as ideias são livres, o consumo é livre e nossas relações sociais são livres, o debate leva ao desenvolvimento. Mais do que isso, o debate livre é a única alternativa à violência. A história moderna nos ensinou a persuadir com retórica em vez de impor por violência e medo. Devemos estimular o caminho do debate, negar a violência e, assim, reforçar as liberdades civis. Podemos usar adjetivos, escrever cartas ou publicar colunas. Sem censura.
PS: Toda coluna terá seu link divulgado no meu perfil do Twitter, acompanhada de referências bibliográficas sobre os temas tratados.
*DOUTORA EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DO ESTADO DE NOVA YORK E PESQUISADORA DA EESP-FGV