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Isabelle Barone – Gazeta do Povo

Texto aprovado é um substitutivo do relator Elmar Nascimento (DEM-BA): caminho aberto para privatização da Eletrobras.| Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (19), por 313 votos a 166, a medida provisória 1.031, que autoriza a privatização da Eletrobras. A versão final do relatório, escrita por Elmar Nascimento (DEM-BA), acabou deixando de fora uma série de pontos tidos como controversos (saiba quais são aqui). Após a aprovação do texto-base, os deputados rejeitaram todos os destaques que buscavam alterar o parecer do relator. O texto da MP ainda precisa passar pelo Senado.

Entre as principais propostas do texto aprovado há a previsão de contratação de termelétricas a gás natural, a garantia de benefícios a trabalhadores da Eletrobras e a destinação do superávit financeiro da Itaipu – que não será privatizada – a programa social e ao alívio da tarifa dos consumidores.

A proposta deve chegar ao Senado faltando pouco mais de um mês do prazo final de expiração, 22 de junho. Caso não seja votada até lá, a medida “caduca”, isto é, perde validade. Há temor, por parte da equipe econômica e apoiadores, de que a CPI da Covid-19 no Senado dificulte a tramitação da matéria em tempo hábil. Foram apresentadas mais de 570 emendas à MP.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse ter feito um acordo com Rodrigo Pacheco (DEM-MG), presidente do Senado, para que as MPs cheguem na Casa com pelo menos 30 dias de antecedência ao prazo final para a apreciação. Nos último ano, algumas medidas acabaram caducando por chegar “em cima da hora” no Senado.

Nascimento defendeu, durante a votação, que “qualquer avanço dependerá de um processo exitoso de desestatização, permitindo a liberação de entraves legais que limitam as opções de gestão de empresas estatais”.

“Nós temos bilhões para conservação de bacias hidrográficas, melhoria na qualidade dos reservatórios. Portanto, mais energia gerada e menor custo para o consumidor. A empresa não está sendo vendida para esse ou aquele proprietário, ela se transformará numa corporação”, disse o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR).

Confira, a seguir, os principais pontos da proposta aprovada pelos deputados (o site da Câmara mostra como votou cada parlamentar):
Capitalização e golden share
A privatização será feita por capitalização, a partir da emissão de novas ofertas públicas de ações da estatal. Os atuais acionistas terão seu capital diluído e o governo federal, que hoje detém 51% das ações, perderá a posição de acionista controlador. Por outro lado, a União terá direito a uma “golden share” – ação de classe especial que lhe garante poder de veto em decisões da assembleia de acionistas.

A MP veda que qualquer acionista ou grupo tenha participação maior que 10% no capital social da empresa. “O aumento do capital social da Eletrobras poderá ser acompanhado de oferta pública secundária de ações de propriedade da União ou de empresa por ela controlada, direta ou indiretamente”, prevê o texto aprovado.

Contratação de térmicas a gás e Pequenas Centrais Hidrelétricas
Inicialmente, o relatório de Nascimento condicionava a privatização da Eletrobras à contratação prévia de térmicas a gás e Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH). Após críticas de que o ponto inviabilizaria o processo, já que não haveria tempo para a realização dos leilões desses empreendimentos, o deputado recuou.

O parecer final ainda prevê a contratação de geração termelétrica movida a gás em leilões nas regiões Centro-oeste, Norte e Nordeste. Mas não obriga isso previamente à capitalização. Devem ser contratados 6 mil megawatts (MW) de usinas térmicas movidas a gás e 2 mil megawatts (MW) de PCH. A proposta, segundo Nascimento, tem o objetivo de “conferir maior segurança energética no cenário de transição decorrente da desestatização da Eletrobras”. Para alguns analistas, essas medidas podem acabar encarecendo as tarifas para os consumidores.

Superávit da Itaipu vai bancar programa social e alívio de tarifa
No processo de capitalização da Eletrobras, a hidrelétrica binacional Itaipu e a Eletronuclear não poderão ser privatizadas. Uma nova estatal ou empresa de economia mista vai gerir as duas companhias. A partir de 2023, quando os empréstimos e financiamentos da Itaipu devem estar quitados, 75% dos resultados financeiros da companhia serão destinados à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Trata-se de um fundo para o qual contribuem as distribuidoras, voltado ao custeio de políticas públicas e alívio das tarifas.

Os outros 25% dos resultados financeiros da Itaipu serão direcionados a programas de transferência de renda. O superávit financeiro da empresa é estimado em U$ 1 bilhão ao ano. Hoje, cerca de 48,9% de custo médio de geração de energia pela hidrelétrica binacional são destinados à amortização de empréstimos e financiamentos. Já a partir de 2033, 50% desses recursos serão destinados à CDE, 25% para programas sociais e 25%, para a empresa responsável.

Pelo prazo de seis anos a partir da desestatização, a empresa também deve manter o direcionamento de parte dos recursos para o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel).

Consumidor “cativo” será beneficiado
Outros R$ 25 bilhões oriundos da capitalização serão destinados à CDE, para o alívio da conta de luz dos consumidores “cativos”, composto, obrigatoriamente, por todas as residências e parte do comércio e da indústria. Nesse mercado, cada um obrigatoriamente consome energia da distribuidora que é concessionária de sua região, e a Aneel fiscaliza e define os reajustes anuais.

A proposta original era destinar metade desses recursos para “beneficiar”, ao longo dos anos, todos os consumidores – isto é, do cativo mas também do mercado livre. Desse mercado, podem participar apenas grandes consumidores, como estabelecimentos comerciais de grande porte e indústrias. Nele, o consumidor negocia contrato de energia diretamente com o gerador, os quais definem, entre si, o prazo de duração do contrato e os valores da energia.


Garantias para funcionários da Eletrobras
Sob justificativa de “insegurança jurídica” aos trabalhadores da Eletrobras, o texto aprovado determina que a União reserve parte das ações representativas do capital da estatal a eles. Funcionários que tenham se desligado da empresa nos últimos dois anos também poderiam ter direito. Os empregados desligados terão o prazo de seis meses após a sua rescisão de vínculo trabalhista, desde que o seu desligamento ocorra durante o ano subsequente ao processo de capitalização, para exercer esse direito.

A União também poderá, de forma facultativa, promover o aproveitamento do trabalhadores que perderem seus empregos em decorrência privatização em outras empresas públicas federais, em cargos de mesma complexidade e remuneração similares. Dados divulgados pela Eletrobras dias atrás mostram que os fundos de pensão de seus empregados fecharam 2020 com déficit de R$ 6,8 bilhões.

Recursos para projetos de revitalização
Pelo menos R$ 8 bilhões oriundos da privatização serão destinados à revitalização de programas regionais. O Ministério de Minas e Energia será responsável pela gestão e definição dos projetos. Serão beneficiárias: a bacia do Rio São Francisco, os reservatórios de Furnas, a bacia do Rio Parnaíba e o Rio Madeira.

Oposição recorre ao STF para tentar barrar tramitação da MP da Eletrobras
Na tarde de quarta, líderes da oposição na Câmara recorreram ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar barrar a tramitação da MP da Eletrobras. Foram impetradas três ações – uma delas, um mandado de segurança. O grupo alega que a proposta não passou por nenhuma comissão mista e que não houve ampla discussão da matéria. Isso ocorreu porque, no último ano, a Corte permitiu que medidas provisórias fossem direto a Plenário, em função da pandemia. O ministro Luís Roberto Barroso negou o pedido de mandado de segurança.

“Uma proposta dessa gravidade não deveria tramitar como medida provisória. É um açodamento privatizar nesse momento, é um péssimo negócio para o país”, afirmou, em coletiva de imprensa, o líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ).

Pelo menos 39 associações ligadas ao setor elétrico também se manifestaram. Nesta quarta, o grupo publicou um manifesto em que pede uma “capitalização equilibrada”. No entendimento dos grupos, algumas das alterações no texto o tornaram desequilibrado. “Somos contra a inserção de dispositivos que encareçam a energia no Brasil, seja pela obrigatoriedade de compra, pela inserção de subsídios a segmentos do setor elétrico, seja pela distribuição desigual dos benefícios entre todos os consumidores”, diz a nota. “Nessas condições, é melhor reavaliar a capitalização da Eletrobras e pensar em alternativas menos danosas à sociedade”.


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By valeon

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