O sábio e estratégico silêncio de Bolsonaro
Ricardo Santi
Jair Bolsonaro e Daniel Silveira
O caso Daniel Silveira mostra um amadurecimento de Bolsonaro em sua forma de conduzir a política do governo.
Muitos estão criticando o silêncio do presidente diante do grande vilipêndio que os ministros do STF praticaram contra a Constituição, contra a liberdade de expressão e contra a democracia.
Não há dúvidas de que foi uma tremenda injustiça e uma tremenda ilegalidade.
Mas por mais que isso seja revoltante, a omissão foi o melhor a fazer. Qualquer movimento de enfrentamento contra o Supremo nessa circunstância agravaria a situação ao invés de ajudar.
Fosse há 1 ano atrás, Bolsonaro teria reagido de forma exaltada, criando uma crise institucional. Por mais que ele tivesse razão, seria péssimo para a condução do governo.
Hoje, mais maduro, mediu consequências e pensou nas prioridades do país e do governo.
Certamente Daniel Silveira foi um excelente deputado, muito leal, que merece toda gratidão e reconhecimento. Mas qualquer movimento para socorrê-lo nessa situação na qual ele mesmo se colocou, e cujo resultado era previsível, poderia colocar todo projeto de resgate do Brasil a perder.
Quais seriam as consequências de Bolsonaro tentar intervir nesse caso?
A primeira coisa a entender é que existe uma coisa chamada capital político. E que esse capital político é limitado como o dinheiro.
Capital político, a grosso modo, é a capacidade do governo negociar e articular para que suas pautas sejam aprovadas, para barrar pautas que sejam contra seus interesses, e até mesmo para se manter no cargo.
Ele pode ser grande, mas existe um limite, a não ser que você tenha poderes de ditador.
O capital político de Bolsonaro é composto basicamente pela sua popularidade, pelo poder da caneta presidencial, e pelo seu alinhamento com interesses de certos grupos que compõem o Congresso Nacional.
Quanto mais popular, mais parlamentares se aproximam dele para aumentarem suas chances de reeleição. A caneta presidencial permite negociar cargos e emendas. O alinhamento com interesses de grupos ajuda a somar forças para avançar projetos. Tudo isso é capital político.
A capacidade de persuasão desse capital político é limitada, tanto em quantidade, quanto em intensidade daquilo que se precisa negociar.
A cada vez que o governo precisa da aprovação do Congresso para alguma coisa, tem que gastar um pouco desse capital. Você pode pedir para um deputado votar em uma ou duas pautas que você quer, mas se pedir muita coisa, vai ficando mais difícil de convencer. Vai havendo um desgaste.
É como quando você acabou de conseguir que um colega quebrasse um baita galho pra você, e logo em seguida você precisasse pedir mais um grande favor para essa mesma pessoa. Seria muito mais fácil, se não tivesse precisado do favor anterior, né?
Agora que eu expliquei o que é capital político, vamos ao contexto atual.
Bolsonaro acabou de eleger aliados na presidência das duas casas legislativas. Isso vai ajudar muito a conduzir a agenda do governo, mas deve ter custado um baita capital político.
Agora o governo tem que aprovar a reforma administrativa, reforma tributária, eleger a Bia Kicis na CCJ, além de vários outros projetos dos quais a prosperidade país depende. Imaginem o custo político de tudo isso.
Agora, vamos tentar calcular o custo político de tentar ajudar o Daniel Silveira.
Lira, quando se candidatou à presidência da Câmara, se propôs a ajudar a agenda do governo a andar, em troca do apoio do governo à sua candidatura.
Em nenhum momento se comprometeu a ficar blindando bolsonaristas das encrencas que eles arrumam.
Ao se esforçar para apaziguar a situação e amenizar as coisas para o Silveira, ele fez muito mais do que em tese teria obrigação de fazer.
Se o governo for pedir ao Lira e seus aliados algo além do que já estava acordado, pode custar bem caro.
Os bolsonaristas deveriam ser mais gratos a ele, e não ficar acusando de trairagem só por ele não ter arriscado o próprio pescoço em uma briga que não é dele.
A gente sabe que mais da metade dos deputados são réus em ações que um dia irão chegar no STF. Se não são réus, são investigados em inquéritos que podem virar ações que irão tramitar na “supreminha”.
Dá pra entender por que a maioria dos deputados não quer se indispor com os ministros, não dá?
Agora respondam com sinceridade:
Quantos deputados teriam coragem de votar pela soltura dele nessa situação? Quantos cargos em estatais, emendas parlamentares e sacrifícios de projetos do governo isso custaria?
Estão entendendo?
Depois de fazer uma articulação difícil pra caramba, pra salvar o deputado, como é que o governo ainda vai chegar nos deputados e senadores e pedir pra votar a favor das reformas? É como a situação do segundo favorzão que eu exemplifiquei.
É como quando você tem dinheiro apertado pra comprar um apartamento e de repente tem que gastar metade em alguma emergência. Se você gastar esse dinheiro, você não vai conseguir comprar o apartamento.
Obs: Bolsonaro não está comprando ninguém, mas capital político se gasta como o dinheiro. Espero que entendam a analogia.
Essa intervenção colocaria em risco toda estratégia de governabilidade que Bolsonaro construiu durante os últimos dois anos.
Mas então, o que fazer? Como reagir a tamanho descalabro?
A única forma de melhorar a composição do STF é com Bolsonaro permanecendo no governo e elegendo um sucessor em 2026. Com isso, teríamos 7 novos ministros até 2030.
Se o governo não conseguir emplacar as reformas, a economia do país piora e Bolsonaro não se reelege em 2022. Aí a esquerda continuará colocando ministros no Supremo.
A reação tem que ser a longo prazo e bem planejada, no estilo “O Conde de Monte Cristo”.
Foco:
– Governabilidade e aprovação das reformas econômicas, para garantir a reeleição e assim poder indicar mais ministros ao Supremo.
– Eleger senadores conservadores em 2022, que tenham coragem de tomar providências contra os ministros.
O resto é ejaculação precoce.