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Francisco Escorsim – Gazeta do Povo

Imagem ilustrativa.| Foto: Fotorech/Pixabay

Todo ansioso é uma pessoa à frente do seu tempo. Antes da pandemia chegar por aqui, por exemplo, soube de vários que já haviam pegado Covid-19 umas três vezes. Achei pouco científico, mas como eu mesmo tinha sido re-infectado antes dos idos de março de 2020 chegarem, fiquei incerto e consultei o Átila Imunizando, que era o visionário oficial da época.

Como ele tinha afirmado, com a falta de serenidade no olhar e na fala típica de um Messi da ansiedade, que até agosto do ano passado teríamos 1 milhão de mortos por aqui, não havia mais como ignorar a realidade que eu já estava infectado pela terceira vez. E, olha, na terceira é pior, viu? Os anticorpos desistem de você, sério. Devo ter morrido ao menos duas vezes naquela época.

Agosto de 2021 está chegando e ainda faltam em torno de uns 500 mil mortos para a previsão se concretizar, mas um ansioso jamais mira o passado, apenas agradece pelo presente de vida (in)tensa e teme o futuro da morte certa. Quem garante que não estarei entre os futuros 900 mil mortos? Porque certamente haverá 3 trilhões de cadáveres da Covid-19 até dezembro, com a chegada da variante Delta.

Ainda bem que temos as vacinas, ao menos. Queria tomar umas 4 doses, uma de cada tipo, para ter ao menos uns 10% de chance de sobrevivência, mas ainda não há venda disponível e o poder público fica aí genocidamente aplicando apenas uma e deixando a segunda para quando o carnaval chegar. Até quando?

Aliás, peguei a covid-19 pela quarta vez, semanas atrás. Vinha chegando o dia da minha idade ser chamada para o Pavilhão da Cura em Longas Filas com Aglomeração Espaçada Mais ou Menos, aí, já viu, tive a doença junto com a reação antecipada da vacina. Foi terrível, praticamente nasci de novo. E posso provar.

Faltavam duas semanas para o dia estimado. Encontrei com alguns amigos, por pouco tempo, mas o suficiente para a minha mente contaminar o vírus, abrindo um portal dentro de mim como um Thanos, trazendo a doença.

Fiquei atento aos primeiros sintomas. Não cairia no erro de março do ano passado, quando segui o protocolo Mandetta de não procurar hospital se não estivesse com falta de ar. Agora, ao menor sinal, me auto-intubaria. Para aumentar minhas chances até chegar no hospital.

Pois os dias foram passando e eu acalmando porque nem sinal de nada, até que no quinto dia desde aquele encontro um mal estar me tomou e sintomas de rinite me atacaram como a Alemanha em 2014 no Maracanã. E agora, dr. Fauci? Até hoje aguardo resposta ao meu e-mail…

Foram três dias torturantes, afinal, o tal do PCR só poderia ser feito depois de uns dias de sintomas. Nem Jesus Cristo passou pelo que passei, pois ele teve apenas uma noite no horto das Oliveiras, morrendo no dia seguinte para ressuscitar no terceiro, enquanto eu passei três dias inteiros suando sangue antes de confirmar que morreria.

No dia do exame, o primeiro desse inverno polar que vivemos aqui em Curitiba, os termômetros marcavam temperatura abaixo de zero e quando cheguei à farmácia, crente que seria o primeiro a ser atendido, surpreendi-me com um velhinho brigando com o farmacêutico porque seu remédio teria sido vendido já aberto, pelo que entendi.

“Tô com covid, quero fazer o teste”, disse com firmeza e muita serenidade, ao que o velhinho quase caiu sobre as prateleiras com várias marcas de gel lubrificado, saindo correndo, esquecido do remédio semi-aberto. O atendente, em agradecimento, fez rapidamente o teste. Não sei dizer o que se passou nos 15 minutos que fiquei aguardando o resultado, pois estive falecido, só lembro de pedir para ele repetir quatro vezes o resultado.

“Há na vida momentos privilegiados nos quais parece que o Universo se ilumina, que nossa vida nos revela sua significação, que nós queremos o destino mesmo que nos coube, como se nós próprios o tivéssemos escolhido”, escreveu o filósofo Louis Lavelle sobre o momento que vivi quando entendi que o teste deu negativo.

Entretanto, os sintomas não desapareceram, ao contrário, pioraram. O que parecia uma crise de rinite virou uma gripe mais forte nos dias seguintes, com uma dor de cabeça constante. “E se o exame deu falso negativo?”, mortifiquei, morrendo de novo.

Faltando 48h para me vacinar, a gripe parecia ter ido embora, mas a reação da vacina já era realidade, dando-me uma dor de cabeça forte e constante. Ainda assim, fui vacinar, afinal, nem toda nuvem engendra tempestade.

Você é um obeso político mórbido?
Como bom ansioso, preparei-me para as próximas 48h selecionando uma série para maratonar, remédios para a reação, chás, muitos cobertores e um testamento. Mas graças a Deus, não senti nada além da dor de cabeça já existente e passado o período possível da reação, até a dor de cabeça se foi como se não tivesse vindo. Nasci de novo, portanto.

Você pode estar achando que sou hipocondríaco. Não sou, mas entendo ser confortável pensar assim, transforma em aceitável a sua ansiedade. Mas só vai durar até você passar por alguma situação crítica de risco altíssimo de morte, como a do aviso de que o porteiro do seu prédio testou positivo para Covid-19. Quando isso acontece, todo ansioso vira um mártir incompreendido.


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