Política
Lula nega revanche

Por
Diogo Schelp – Gazeta do Povo


Lula na cerimônia de posse no Congresso Nacional| Foto: Reprodução/YouTube

Ao contrário do que havia antecipado Alexandre Padilha, ministro de Relações Institucionais do novo governo, nos discursos de posse de Lula não predominou o “tom de união do País”. Ao contrário, se comparado ao discurso de vitória eleitoral, na noite de 30 de outubro, a promessa de união ou de pacificação nacional foi a grande ausente do discurso de posse no Congresso Nacional. O tema só apareceu com mais peso no posterior pronunciamento no parlatório do Palácio do Planalto, nos trechos em que Lula se comprometeu a governar para todos os brasileiros, apesar das diferenças.

O que de fato marcou os discursos de posse de Lula foi o vigoroso rechaço ao governo de seu antecessor, Jair Bolsonaro. Este foi acusado por Lula de ter feito uma gestão de destruição de políticas públicas. As palavras “destruição” ou “destruir” foram repetidas cinco vezes na fala no Congresso.

Ao relembrar a campanha eleitoral, Lula fez uma análise maniqueísta das visões de mundo que nela se enfrentaram. A dele e de seu grupo político seria “centrada na solidariedade e na participação política e social para definição democrática do destino do país”, enquanto a outra, “no individualismo, na negação da política, na destruição do Estado em nome de supostas liberdades individuais”.

Lula disse que “nunca os recursos do Estado foram tão desvirtuados em proveito de um projeto autoritário de poder” e que “nunca a máquina pública foi tão desencaminhada dos controles republicanos” — omitindo, claro, que em governos anteriores do PT os recursos do Estado e a máquina pública foram, sim, usados de maneira inédita com o propósito de perpetuar um projeto de poder.

O novo presidente disse, também, que o diagnóstico do estado atual do governo recebido da equipe de transição é “estarrecedor”, pois recursos para áreas essenciais teriam sido esvaziados e que estatais e bancos públicos teriam sido dilapidados. Segundo ele, “os recursos do país foram raspados para saciar a estupidez dos rentistas, de acionistas privados nas empresas públicas”. E foi apenas nesse ponto, ao prometer “reconstruir o país”, que Lula afirmou que fará “um Brasil de todos e para todos”.

Uma das frases mais significativas do tom predominante no discurso de posse no Congresso é aquela em que Lula ao mesmo tempo acusa os adversários do que há de pior, a inspiração fascista, e anuncia que lidará com eles com os poderes da democracia: “O mandato que recebemos aceita adversários inspirados no fascismo com poderes que a Constituição confere à democracia.”

Lula diz que não trará revanche a esses adversários (e, implicitamente, àqueles que clamaram por golpe em desrespeito ao resultado das eleições), e sim o rigor da lei. “Não carregamos nenhum ânimo de revanche contra os que tentaram subjugar a nação a seus desígnios pessoais e ideológicos, mas vamos garantir o primado da lei que errou responderá por seus erros com direito a ampla defesa dentro do devido processo legal”. Ou seja, apesar de negar revanchismo, ele vê, sim, a necessidade de responsabilização criminal de ex-integrantes do governo, “direito a ampla defesa dentro do devido processo legal”.

Fica claro, em um dos trechos, que, para Lula, entre aqueles que deverão ser atingidos pelo “primado da lei” é o ex-presidente Jair Bolsonaro. Quando fala das mortes pela pandemia de covid-19, Lula diz que a “atitude criminosa de um governo negacionista, obscurantista, insensível à vida” e “a responsabilidade por esse genocídio hão de ser apuradas e não devem ficar impunes”.

O discurso de posse de Lula no Congresso contém uma longa lista de medidas de governos anteriores (principalmente de Bolsonaro, mas também de Michel Temer) que serão revogadas, entre os quais a regra do teto de gastos até o acesso mais fácil dos cidadãos às armas.

Depois, em discurso no parlatório do Palácio do Planalto, criticou a violência política na campanha eleitoral e deu mais peso à ideia de união nacional, para “reconstruir” o país. Ou seja, Lula pediu união, mas para reverter o projeto de destruição que, na sua visão, estava em vigor até agora.

Mais do que um discurso de união ou de pacificação, o que Lula apresentou foram falas de ruptura em relação aos últimos seis anos e com pretensões de refundação nacional.

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